Havia uma pequena vila cravada numa densa serra, alta e fria
nos meses de inverno. Sua aparência, funesta nos meses quentes, se tornava bela
e misteriosa na época do frio. Ali reinava a paz indevassável e seus habitantes
viviam fartamente com a certeza de que tudo aquilo lhes bastava e nunca
acabaria. Permanecia sobre a vila, perdida e fria, um nevoeiro que teimava em
ficar ali, parado por dias, meses, anos a fio. Muito raramente os raios do sol
se esgueiravam por entre o nevoeiro e iluminava as casas por instantes. Um dia,
porém, ao sul do vilarejo se formou uma grossa e pesada tempestade. Dia após
dia a tempestade se tornava mais forte e se aproximava mais e mais da
cidadezinha pequena.
Numa manhã nebulosa a tempestade abateu-se, enfim, sobre
a cidade. Os ventos cortavam os rostos mais incautos com força. Foram dias
assim, meses. Era preciso ficar dentro de casa, com a lenha crepitando no fogo, para que o calor lhes aquecesse, mesmo que debilmente.
Um dia também, a tempestade se foi. Depois que ela se perdeu por trás das últimas montanhas que
podiam ser vistas ao norte, estabeleceu-se um dia claro e ensolarado sobre a
vila. No outro dia, novamente sol. A assim se sucederam vários meses. A luz
trouxera um entendimento diferente aos habitantes da distante vila. Embora eles
soubessem que o nevoeiro foi-lhes necessário até aquele momento para darem
melhor valor à luz, eles também sabiam que um dia o nevoeiro poderia retornar
do mesmo lado da serra e trazer os sentimentos de outrora novamente. Seria
então necessária nova tempestade para que tudo se fizesse luz de novo. Era
melhor para todos eles que o sul só trouxesse ventos calmos. Assim a luz nunca
mais iria embora.