Depois que nos vimos pela última vez,
ficamos com a apreensão natural que abate quem está para perder alguém que
tanto se quer. Telefonei-lhe no outro dia assim que deu o horário que,
habitualmente, seu marido saía para trabalhar. O telefone tocou longamente.
Depois de chamar por duas vezes ela atendeu por fim.
- Alô. –
aquela voz rouca que tanto me encantara estava tomada pelo sono.
- Sou eu, Alicia. – respondi-lhe.
- Amor? Onde você está?
- Na porta da sua casa, dentro do carro.
- Por que você não entra um pouco?
- O convite é tentador.
- Estou descendo.
Alicia surgiu na porta de sua casa
vestida com um peignoir preto que contrastava
lindamente com sua pele alva. Ela veio até o carro, debruçou-se e deu-me um
beijo quente nos lábios. Pedi que entrasse no carro.
- Não vou suportar você longe de mim.
- Não me deixe ir embora.
- Não deixar? Só se você deixá-lo. E fique comigo de uma vez por todas.
Depois desses pormenores que agora esmiúço
nessas parcas linhas, refleti durante longas horas sobre a velocidade que
caminhara nossa relação. De um encontro despropositado, ingênuo por assim
dizer, tudo sucedera na velocidade do relâmpago e estávamos nós ali
apaixonados, à beira de uma loucura para estarmos juntos definitivamente. O
vento vem de repente e toma conta da atmosfera ambiente, quando nos damos conta
o vento passou. Assim foi conosco. Voltemos às minhas memórias.
Alicia não queria ir embora com o
marido. Estudava um meio para dizer-lhe que não podia deixar Minas, mas todas
as vezes que começava a pensar no assunto a dificuldade da solução lhe impelia a
alterar a rota dos pensamentos e abandonar o plano para ficar.
- Eu quero ir embora com você.
- E sua filha?
- Ela vai comigo.
- Isto está parecendo uma loucura sem tamanho.
Alicia esfregava as mãos uma contra
a outra na tentativa de ter algo o que fazer com as mãos que não paravam, não
encontravam um lugar tranqüilo para repousar. Eu a olhava nos olhos, a face pálida
pelo vento frio que corria lá fora. Seus olhos me diziam que estava com medo,
que nossa situação era algo sem precedentes para ela, que ela realmente me
amava e confiava a mim sua vida e sua felicidade. Não só a dela, mas também a
da filha que tinha 10 anos.
Não mais resistindo ao charme que
Alicia derramava em mim, mesmo que inconscientemente, dei partida no motor do
carro e arranquei. Paramos em frente a minha casa. Entramos. Na porta da sala,
Alicia ainda de roupas de dormir, olhava-se no espelho do hall e por breves
segundos dava-se conta da loucura de sair àquela hora de casa, com trajes impróprios
para uma mulher casada estar na rua, entrar no carro do amante, em plena luz do
dia. Tirei-lhe o peignoir, beijei-lhe fartamente os lábios gelados pelo frio. Alicia
empurrava-me sem querer se desvencilhar do meu corpo. Ela tomou-me com as mãos
tocando os flancos do rosto e disse abruptamente:
- Precisamos encontrar uma solução para nosso dilema.
O tesão me forçava a amá-la ali
mesmo na sala de estar, e colei-lhe os lábios no pescoço e percorri-lhe toda a
extensão incendiando Alicia. Deixamos a conversa nesse ponto e fomos para a
cama. Como o náufrago que procura avidamente a terra firme, nós nos procurávamos
imersos em prazer, loucos por amar.
À hora do almoço levei-lhe para casa
já com roupas apropriadas, com o problema ainda por resolver, mas satisfeitos
em nosso desejo infindável.