segunda-feira, 24 de junho de 2013

Marcela!

Houve uma época em minha vida em que eu sabia ainda menos sobre tudo. Eu saía todas as manhãs muito cedo, caminhava até o trabalho que distava alguns poucos quilômetros de casa. Por vezes ia de carro, mas gostava mesmo é de ir caminhando, pensar enquanto caminho faz bem para mim. No fim da tarde, ao voltar para casa, passava no mesmo supermercado para comprar algo que estivesse faltando. Naquele dia, eu estava parado numa enorme fila do açougue e percebi que a pessoa que estava atrás de mim respirava com certo nervosismo, mudava a posição das pernas inúmeras vezes, o que denotava para quem estivesse ali que ela tinha pressa em ser atendida logo. Voltei-me discretamente para ver quem estava tão impaciente daquele jeito e me deparo com uma mulher com seus 25 anos, pele levemente morena, olhos castanhos claros, cabelos negros, longos, lindos, cuidadosamente escovados, os quais caíam até sua cintura. Ela notou que sua impaciência havia despertado meu interesse em saber de onde procedia. Então ela deu um ligeiro sorriso e reclamou dos funcionários que atendiam aos clientes que nos precedia na imensa fila. Eu concordei com a cabeça e retribuí o sorriso.

O cheiro de sua colônia tinha base amadeirada, combinava com ela. A moça trajava um vestido bem leve, até pouco acima do joelho – decente como se diz por aí. Calçava uma sandália bem delicada, que combinava com sua bolsa e usava uma fina corrente prateada no pescoço, mas não pude notar o detalhe do pingente naquele primeiro momento.

De repente seu telefone celular toca, e ela revira sua bolsa, e certamente o interlocutor esperou vários toques até ela atender por fim: alô? Sim é a Marcela. Apesar de ela falar baixo, eu não resisti e prestei atenção à sua conversa. Deduzi que ela falava com uma mulher, uma amiga talvez, e ela esperava por Marcela em algum lugar.

A conversa entre as duas não demorou dois minutos. Marcela desligou o telefone e o reteve nas mãos. Como sua impaciência continuava, disse, por fim, chamando-a pelo nome: Marcela, acho que não posso te ajudar muito, mas se você quiser, pode tomar meu lugar na fila. Ela me olhou tendo seus olhos denunciado certa surpresa, me agradeceu e aceitou a proposta. Trocamos de lugar. Como eu havia sido solícito, e adianto de antemão, sem segundas intenções, passamos a conversar sobre a fila, o preço da carne, enfim, assuntos corriqueiros. Devo confessar também que não queria mais que a fila andasse, porque Marcela tinha uma voz pouco rouca, e um modo de olhar diferente quando me olhava. Era uma companhia de fila muito agradável. Não resisti à tentação e perguntei a razão daquela pressa toda. Ela respondeu que precisava ir ver sua amiga que estava para se casar e havia se empenhado nos preparativos de uma festa surpresa para ela. Eram amigas de infância, estudaram juntas e tinham apostado quem se casaria primeiro. Sorri com a aposta feita e disse imediatamente: então você perdeu a aposta? Ela sorriu de volta, me olhou nos olhos e disse: é verdade, hoje em dia homem sério é raro como diamante. E ficamos conversando a partir de então sobre assuntos do coração. Imagino que Marcela deva ter se interessado pela forma como eu pensava o amor já naquela época, como via uma relação a dois, pois notei que sua pressa havia se diluído quase que completamente. Na verdade, fui sincero, e o fato de tê-la despertado o interesse, foi uma consequência natural e espontânea e não uma razão em si.

Dois atendentes ficaram livres simultaneamente e fomos atendidos ao mesmo tempo. Trocamos rápidos olhares enquanto escolhíamos o que queríamos comprar e percebi que ela havia se interessado por minha pessoa, de fato. Terminei de comprar minhas coisas antes dela, me despedi dela com um gesto de cabeça e fui caminhando tranquilamente para o caixa onde aguardava minha vez em nova fila, menor que a do açougue, mas ainda de um tamanho que causava náuseas em quem tinha pressa.

Pouco depois senti um perfume amadeirado no ar, e instantaneamente ouvi um “oi” vindo de trás de mim. Olhei fingindo naturalidade e deparei com um sorriso lindo, denunciando dentes alvos e perfeitamente perfilados. Era ela. Fiz um comentário descontraído sobre estarmos novamente na mesma fila e ela achou graça. Conversamos novamente, mas dessa vez havia algo diferente no ar, e é preciso ter certa sensibilidade, certo feeling para notar isso. Conversamos inclusive durante nossa vez de passar as compras pelo leitor ótico, o que fez a operadora do caixa pensar que estávamos juntos. Brinquei com a operadora: ainda não. Notei que Marcela sorriu timidamente e olhou para baixo. E quem sabe interpretar feições, sabe que isso denuncia uma aprovação contida acerca do que foi dito.

Já com as sacolas na mão, perguntei onde estava o carro dela, mas ela me disse que seu carro estava na oficina. Ofereci carona dando o pretexto de que iria ajudar na sua pressa. Ela aceitou prontamente. Deixei-a em sua casa, e selamos a nova amizade com dois beijos no rosto quando nos despedimos. Ah, e seu número de telefone foi anotado no canto do recibo da compra. Em outro post conto como me envolvi por pouco tempo, mas intensamente com essa menina que tinha uma linda história de vida, mas uma triste sina na vida.

Beijo quente.

Apollo.

                                                                                                                                  


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