domingo, 21 de outubro de 2012

Em metáforas


Estivemos no inferno juntos e escapamos de lá. Sempre nos disseram que era impossível sorrir lá dentro e descobrimos que é possível. Fugimos antes de o dia amanhecer por aquela estrada serpenteada de pedras e espinhos. Corremos até onde as flores começaram a surgir ao longe, nas várzeas tomadas de brumas espessas que se iam declinando fragorosamente diante de nossos passos resolutos. Em dado momento percebemos os primeiros alvores da manhã que tinha pressa em chegar para que exorcizássemos de uma vez os nossos demônios. As brumas tomaram conta do ambiente com toda plenitude que lhes era possível, mesmo estando o dia se declarando a nós aos poucos. Então percebemos que a luz não se faz visível logo no início, que é preciso saber enxergar através do opaco. Com o decorrer da caminhada, já cansados, mas mais fortes por estarmos naquele ponto da conquista, paramos naquele bangalô que havia sobre a colina e descansamos nossos espíritos. Vimos finalmente um no outro que dois anos se passam em dois dias. Vimos que o tempo é loucura.
Depois de nos amarmos fartamente, e nos embriagar do doce desejo de nos tocar não só com os sentidos físicos, mas também com os da alma, depois de percebermos um no outro circunstâncias especiais que só os ávidos percebem, você desapareceu quando saímos à porta da casa para continuarmos a caminhada sentido ao leste. Então, vi que no alto de uma montanha estava ela, aquela mulher que me arrebatou novamente do caminho, mas me mostrou um outro que se parecia um atalho. Descobri depois de 10 semanas que havia chegado bem mais perto do mundo em que vivemos. Como o objetivo dela havia se cumprido, ela me acenou docemente, me disse do nosso amor, me deixou nossa semente tenra e bela, e uma torrente de vento abateu-se sobre nós. Foi-se.
Então vi seus cabelos louros e esvoaçantes tocando-me o rosto enquanto você tinha os olhos marejados de lágrimas naquele dia que me encontrou pelo mundo e eu estava extasiado pelos dias que se repetiam incessantes. Eu havia perdido a direção de novo. E sem eu saber, você chegou, me disse coisas que eu havia esquecido, me tocou com seu espírito e ficou uns dias.
Então percebi que toda poeira é leve justamente por poder seguir a direção da ventania, por poder ir tocar outra face em outro lugar e ensinar-lhe a se proteger dos ciscos impiedosos. A ventania é benéfica e sempre me toca o rosto, mas hoje eu sei que devo olhar na outra direção e apenas sentir seu contato fresco na pele.
Sei que o inferno ficou lá atrás, de onde fugimos. Sei que nossa luz se ampliará até nos tomar de alegria. Ela está ainda ali adiante, mas já vemos seu imenso clarão que nos toma de alegria indefinida. Ela está chegando e serão dois sóis a nos clarear.
Sempre soubemos que o amor tem mil faces. Já filosofamos fartamente sobre isso. São mil tons de cinza que se misturam, se fundem, se redescobrem, se redefinem, se perdem em si, porque a luz que os ilumina permite que nunca deva haver dissolução imediata. Quem clareia o espírito com notas sutis de amor, de alegria, de felicidade, vê um pouco mais. Vamos descobrir o que o caminho ainda nos oculta. 

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