Seus olhos
abriam para um novo dia e, preguiçosos, conferiam a janela, a cortina, a TV que
passou a noite ligada. Dormira novamente com a TV ligada. Ela ria, mas se
repreendendo em seguida pelo fato. Lembrou-se, de repente, da mensagem que
enviou para Malbec na noite anterior e da conversa que tiveram. Ele era muito
especial, realmente. Além de lhe parecer muito inteligente, conhecia com
minúcias os vinhos que tanto lhe atraíam pelo romantismo e pelo mito de
milênios. Pronto, sua vida virou-se de cabeça pra baixo. Essas paixões
repentinas não lhe visitavam desde quando se divorciou do marido. Ia com
freqüência a casa de suas amigas, onde um dia, conheceu um quarentão de cabelos
grisalhos, que lhe atirou um olhar daqueles penetrantes e lhe disse oi. Depois
de conversarem por algumas horas, tocaram-se de leve os rostos e se beijaram na
face, selando o primeiro encontro. Depois de poucos meses, descobriu com certa
ojeriza que ele era casado. Com isso, Joana aumentava cada dia mais o muro que
construíra dentro si para se defender dos homens. Aí foi a última vez que se
apaixonara de repente. Temia sofrer, como a criança que teme dormir no quarto
escuro, e prometia para si mesma nunca mais se envolver com os homens. Mas hoje
sentia que algo havia mudado. O muro continuava alto e inacessível, e com essa
segurança, Joana arriscava conversar noites a fio com Malbec, sem saber seu
nome real, quem era, ou mesmo sua idade. Essa era a forma que ela se protegia
de uma provável decepção, afinal, seu muro a protegia contra as ciladas do
coração. Todas as manhãs, na repartição, e todas as noites, em casa, abria as
mensagens doces e apaixonadas do seu “bebedor de vinhos“, e lhe respondia todas
com a mesma doçura e emprestando a cada letra um carinho inenarrável e
inconfessável, mas casual, pensava ela. Nunca mais saíra com Suzana e Marta,
seu interesse pelo barzinho de sempre de repente se esfriou, diria até que
gelou.
Uma noite, ao abrir seu programa de mensagens, deparou
com uma mensagem de Malbec que dizia: “estou na aula, infelizmente não posso
lhe dedicar agora a atenção que você merece. Um beijo quente de paixão.
Malbec.” Pronto! Malbec estudava ainda? Cursaria o ensino médio, uma faculdade?
Um doutorado? Não. Acho que ele faz mesmo é o ensino médio. Então ele deve ser
muito novo. E eu com 4.0. Ai meu Deus! De novo não. Será que não dou sorte no
amor? Será que sempre perco nesse jogo? E divagava sem parar, sem se dar conta
que o tempo voava. Até que num momento, Malbec lhe chamou no computador,
dizendo que já estava em
casa. Com o receio de descobrir o que já previa, perguntou a
ele sua idade. Ele lhe disse qual a razão dessa pergunta já que ela mesma havia
determinado que essas informações não eram necessárias, pois ela preferia a
impessoalidade. Mas diante da insistência dela, ele confessou, afinal. 32. 32?
Pensou ela. 32? Meu Deus! Mas disse alguma coisa, com falsa naturalidade e
disfarçou a decepção que tomara conta dela. Já na cama, dizia para si mesma.
Acabou o encanto.
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