quarta-feira, 25 de abril de 2012

Coisas do coração 3


O dia mal amanheceu e Joana estava a andar de um lado para o outro do quarto pensando: o amor é mesmo cheio de armadilhas e contradições. Os momentos em que ele nos toma, como que de forma voluptuosa e selvagem, apesar da insistência inútil de desvencilhar-nos dos seus braços sedutores, esses momentos nos parecem eternos. Apesar de que a eternidade é impossível de compreender pela forma metafísica. Deus é eterno e o amor é eterno. Mas o que senti por ele não é amor. É o que então? Paixão? Desejo? Cumplicidade? Talvez seja todos esses sentimentos elevados a um extremo inimaginável. Mas amor não. Recuso-me e acabado. Acho que homens jovens devem se apaixonar por mulheres jovens e casarem-se com elas. Acho que homens mais novos dão um trabalho imenso na cama com toda aquela ânsia de possuir as carnes da mulher que ama e deseja. Acho que a sociedade, sobretudo minha filha, não entenderiam um amor assim. Lá vem eu falando de novo em amor. Oras.
Em vão procurou relaxar. Após um choro compulsivo foi ao espelho do banheiro e procurou nele o reflexo do seu rosto. A pele ainda fresca, a boca desenhada com cuidado, os olhos avermelhados e imersos em lágrimas. Procurou em si uma resposta para o seu dilema, mas não a encontrou. Os soluços, as lágrimas ainda presentes mostravam que o dia que mal começara já era testemunha de mais uma crise de choro.
Foi à padaria, preparou o café, cheirou a fumaça que subia do bule e fez uma carinha de mulher com fome. Sorriu quando se imaginou vendo a si mesma naquela situação. Comeu um fragmento do pão passado na manteiga, bebeu uma chávena de café e foi-se para o trabalho.
Seu Patrício não havia ido trabalhar naquele dia. Joana achou estranho, mas não comentou com ninguém. No seu computador nenhuma mensagem de Malbec. Notas fiscais, recibos, pedidos, expedientes, conversas infindáveis ao telefone. Nem viu o dia passar. Sei que o remédio é meter a cara no trabalho, pensou ela. À noite, no seu computador, uma mensagem de Malbec: “me espera logo mais, precisamos conversar, te amo, Malbec.” Joana estremeceu e sentiu uma faísca irromper-lhe os olhos. Me ama? Ele nunca havia dito isso. O que será que ele quer? Apesar de negar para si mesma, Joana estava demasiadamente alterada para notar que havia adorado a mensagem e que iria falar com ele novamente, apesar de fazer jogo duro com o pobre rapaz. Lá pela meia noite, ele entra no programa de mensagens instantâneas e se põe a confessar de forma peremptória e inesperada, seus sentimentos. Disse que a amava apesar de nunca terem-se tocado, e que esse fenômeno o surpreendera também, mas que era fato e não podia fazer nada contra isso. Que precisava materializar esse sentimento, que a queria, de forma efetiva, para ele. Joana sentiu-se sobressaltada com a confissão do rapaz. Disse por fim que era mais velha que ele, que um suposto romance entre ambos não daria certo, que as pessoas iriam falar dela, que a mãe dele não a aprovaria, essas coisas. Nem falou da sua filha. Malbec disse-lhe que tomaria um ônibus para a cidade dela no outro dia, apesar das negativas insistentes de Joana. E disse por fim: vou e acabou-se. Quero ir parar na sua porta, mas como não o posso, espero que você me encontre na rodoviária. Se você não estiver lá, saberei que seu preconceito contra mim foi maior que esse amor que martela seu coração. E despediu-se. Joana sentiu todo o seu ser gelar diante da decisão do rapaz. No outro dia, sábado, às 7 da manhã, ele estaria na sua cidade. E agora? Precisava pensar rápido no que fazer.

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